“Sou feito da inteira evolução da Terra; sou um microcosmo do macrocosmo. Nada há no universo que não esteja em mim. O inteiro universo está encapsulado em mim, como uma árvore numa semente. Nada há ali fora no universo que não esteja aqui, em mim. Terra, ar, fogo, água, tempo, espaço, luz, história, evolução e consciência – tudo está em mim. No primeiro instante do Big Bang eu estava lá, por isso trago em mim a inteira evolução da Terra. Também trago em mim os biliões de anos de evolução por vir. Sou o passado e o futuro. A nossa identidade não pode ser definida tão estreitamente como ao afirmar que sou inglês, indiano, cristão, muçulmano, hindu, budista, médico ou advogado. Estas identidades rajásicas são secundárias, de conveniência. A nossa identidade verdadeira ou sáttvica é cósmica, universal. Quando me torno consciente desta identidade primordial, sáttvica, posso ver então o meu verdadeiro lugar no universo e cada uma das minhas acções torna-se uma acção sáttvica, uma acção espiritual”

- Satish Kumar, Spiritual Compass, The Three Qualities of Life, Foxhole, Green Books, 2007, p.77.

“Um ser humano é parte do todo por nós chamado “universo”, uma parte limitada no tempo e no espaço. Nós experimentamo-nos, aos nossos pensamentos e sentimentos, como algo separado do resto – uma espécie de ilusão de óptica da nossa consciência. Esta ilusão é uma espécie de prisão para nós, restringindo-nos aos nossos desejos pessoais e ao afecto por algumas pessoas que nos são mais próximas. A nossa tarefa deve ser a de nos libertarmos desta prisão ampliando o nosso círculo de compreensão e de compaixão de modo a que abranja todas as criaturas vivas e o todo da Natureza na sua beleza”

- Einstein

“Na verdade, não estou seguro de que existo. Sou todos os escritores que li, todas as pessoas que encontrei, todas as mulheres que amei, todas as cidades que visitei”

- Jorge Luis Borges

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

T. já regressara ao Paraíso

“T. caminhava como se cada passo fosse o primeiro e o último, tocando a Terra como amante a amada. Cada passo era carícia em plena atenção, sem antes nem depois, precisa e não adiada. A Terra, enamorada, estremecia e abria-se a cada toque num silencioso brotar de águas vivas. T. e a Terra eram aliança, elo e halo, tão vibrante que até as aves suspenderam o seu canto, para mais sentirem no ar, nos ramos e nas asas a pujança daquele amor, a irradiação daquele silêncio, o júbilo daquele reencontro.

T. já regressara ao Paraíso”

~ “A Vida de T.”, fragmento de um Diário de Espantos.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Há alguma coisa de novo, interessante e excitante a procurar e a encontrar na vida?

Há alguma coisa de novo, interessante e excitante a procurar e a encontrar na vida? Sim, o total abandono dessa busca e dessa expectativa. Então tudo se manifestará a cada instante novo, interessante e excitante.

Porque a busca e a expectativa de coisas novas, interessantes e excitantes são precisamente a rotina, a banalidade e o aborrecimento que, em fuga a si mesmos, nos mantêm na distracção e na superficialidade que nos impedem de experimentar que tudo, a começar por nós mesmos, é desde sempre e a cada instante tremendamente novo, interessante e excitante. Infinitamente extraordinário e maravilhoso.

Experimentem esquecer estas palavras e repousar agora mesmo a atenção onde quer que seja: respiração, azul do céu, rosto da pessoa mais próxima, objecto mais perto de vós, centro das vossas mãos. Vêem e sentem o Milagre!?

Curso de Introdução à Via do Buda – nível I - 17 e 24 de Janeiro, 19-22h


Curso de Introdução à Via do Buda – nível I (teórico-prático)
17 e 24 de Janeiro | (3ªs feiras, 19-22h)

O curso consiste numa introdução teórico-prática aos fundamentos da via do Buda ou do pleno Despertar da consciência. Aliaremos o estudo de textos, a reflexão e a compreensão intelectual à experiência directa e à vivência interior mediante exercícios meditativos praticados em cada sessão e propostos para ser desenvolvidos em casa. Serão fornecidos textos de apoio.

I.

1. A vida e o Despertar de Siddhartha Gautama. Buda histórico e natureza de Buda. O Discurso de Benares e as Quatro Nobres Verdades: a insatisfação (dukkha), sua origem, sua extinção e a via que aí conduz. A Via do Meio entre hedonismo e ascetismo, essencialismo e niilismo. O Óctuplo Caminho: visão, pensamento, discurso, acção, modo de vida, esforço, atenção e concentração correctos. O sentido experimental e não dogmático da via do Despertar.
Exercícios meditativos: calma mental (shamatha).

II.

A Roda da Vida (bhava-chakra). Os doze elos da origem interdependente e as quatro meditações que afastam do samsara: preciosa vida humana, impermanência e morte, causalidade kármica e sofrimentos do samsara.
2. Verdade relativa e verdade absoluta.
3. Exercícios meditativos: metta-bhavana. As quatro meditações ilimitadas: amor, compaixão, alegria e equanimidade.


O curso será orientado por Paulo Borges. Praticante da via do Buda desde 1983 segundo a tradição Nyingma do budismo tibetano, integra a partir de 2012 os ensinamentos de Thich Nhat Hanh e é desde 2015 filiado na escola Linji (Rinzai) do budismo Ch’an / Zen. Professor de meditação e filosofia budista desde 1999, tendo orientado centenas de aulas, cursos, workshops e retiros em todo o país. Professor de Filosofia da Religião, Pensamento Oriental e Filosofia e Meditação na Universidade de Lisboa. Cofundador e ex-presidente da União Budista Portuguesa (2002-2014). Ex-presidente (2005-2013) e membro da Direcção da Associação Agostinho da Silva. Cofundador e presidente do Círculo do Entre-Ser. Autor e organizador de 45 livros, entre os quais "O Budismo e a Natureza da Mente" (2006, com Carlos João Correia e Matthieu Ricard), “O Buda e o Budismo no Ocidente e na Cultura Portugesa” (organizador, com Duarte Braga) (2007), "Descobrir Buda" (2010), “Quem é o Meu Próximo?” (2014) e "O Coração da Vida. Visão, meditação, transformação integral (guia prático de meditação)" (2015).

Contribuição: 40 euros
Uma real indisponibilidade financeira não é impeditiva.
Uma contribuição superior ao sugerido é bem-vinda se tiver disponibilidade e sentir ser justo.

Este valor deverá ser pago na 1ª sessão, pedimos que cheguem um pouco mais cedo para o efeito. Não dispomos de multibanco.

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Inscrições:
- preenchendo o formulário: https://goo.gl/forms/TGclmc3whj0SaosE2
ou
enviando um email para inscricoes@circuloentreser.org
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O Coração do Mundo, sede do Círculo do Entre-Ser:
Av. Duque de Ávila, 95 – 3º andar
Metro: Saldanha

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

A vida é um sonho da consciência, como a arte e a literatura

A vida é um sonho da consciência, como a arte e a literatura. A diferença é que estas tendem a ser sonhos lúcidos, enquanto a vida não. A arte e a literatura são em geral mais verdadeiras que a vida, porque a consciência sabe serem criações suas que a cada instante se podem transformar, enquanto pelo contrário leva mais a sério o sonho da vida, tanto o vivendo como mais real quanto mais inconsciente está de que tudo nele é também inseparável da sua própria criação, narrativa e interpretação. Ou seja, arte e literatura, igualmente. Por isso nele sofre mais. E é por isto que a arte e a literatura são o sonho consciente que mitiga a dor do sonho inconsciente do viver. Viver tudo como um sonho lúcido é despertar.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Amai tudo


A bordo do barco para o Barreiro, rodeado de todo o mundo e ninguém, o Bem-Aventurado manteve-se recolhido em silêncio e o silêncio converteu-se num murmúrio:

“Em verdade, em verdade vos digo que tudo é sagrado. Este rio é sagrado e sagradas são as terras que banha. Sagrados sois vós e tudo o que percepcionais, ó esquecidos. Amai pois cada vaga e cada grito de gaivota, cada pedra da calçada e cada animal de rua, cada nuvem que passa e cada brisa que vos alisa o rosto. Amai muito tudo, pois tudo, mais do que próximo, vos é íntimo. Amai tudo, pois se não amardes tudo não amareis e vereis que sois também o Pai-Mãe, a Presença que em tudo se oferece. Amai tudo, pois se não amardes tudo jamais vos amareis a vós mesmos”.

Continuou recolhido em silêncio. E à sua volta todos continuaram absortos nos telemóveis, auscultadores, jornais, livros, pensamentos e preocupações.

Uma gaivota gritou no céu anoitecido e a sirene do barco soou, pois havia muito nevoeiro.

~ Sutra-Evangelho de Lisboa, III, 13.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

"Serás comigo o Paraíso"


"Os céus abriram-se no metro do Rossio à hora de ponta. Assim escutei eu:

Queres saber quem és? Sonda toda a angústia e saudade desta multidão. Agarra pelo braço o mais próximo, olha-o nos olhos, beija-lhe o coração. O teu nome aparecerá escrito em todo o lado. Mas será apenas um instante. Logo te esquecerás para sempre e serás comigo o Paraíso"

Sutra-Evangelho de Lisboa (revelado numa vertigem a bordo de um cacilheiro, confirmado num espanto na Cova do Vapor, traduzido para uma língua sem boca), VIII, 24.


Sutra-Evangelho de Lisboa, XI, 3


"Assim escutei eu:

Contemplem o entardecer na barra do Tejo. Abandonem tudo o que mais amam. Morram de bem-aventurança. Comunguem a hóstia do Real. Preservem o silêncio na ponta da língua. Este Vento já em vós sopra desde sempre. Quem tiver pulmões que respire"

Sutra-Evangelho de Lisboa (revelado numa vertigem a bordo de um cacilheiro, confirmado num espanto na Cova do Vapor, traduzido para uma língua sem boca), XI, 3.