“[…] neste cenário de todos os dias, e de um modo inteiramente inesperado
(pois jamais havia sonhado com tal coisa), os meus olhos foram abertos e, pela
primeira vez em toda a minha vida, tive um vislumbre da beleza extática da
realidade…
[…] Não vi nenhuma coisa nova, mas vi todas as coisas habituais numa
miraculosa luz nova – no que acredito ser a sua verdadeira luz. Vi pela
primeira vez quão selvaticamente bela e jubilosa, para além de quaisquer
palavras minhas para o descrever, é a totalidade da vida. Cada ser humano
atravessando aquela varanda, cada pardal que voava, cada ramo oscilando ao
vento, estava integrado e era parte do inteiro e louco êxtase de encanto,
alegria, significância e embriaguez da vida.
Não que por uns poucos e excitados momentos eu imaginasse toda a existência como bela, mas, antes, a minha visão
interna foi desobstruída para a verdade, de modo que vi o real encanto que está sempre aí, mas que tão raramente
percepcionamos, e soube que todo o homem, mulher, ave ou árvore, toda a coisa
viva diante de mim, era extravagantemente bela e extravagantemente importante.
E, ao contemplar, o meu coração fundiu-se e abandonou-me num arrebatamento de
amor e deleite. […]
Uma vez, no meio de todos os cinzentos dias da minha vida, vi o coração
da realidade; testemunhei a verdade; vi a vida como ela realmente é –
arrebatadora, extática, loucamente bela e cheia até transbordar com uma alegria
selvagem e um valor indizível. Durante esses momentos glorificados estava
apaixonada por cada coisa viva diante de mim – as árvores no vento, as pequenas
aves a voar, as enfermeiras, os internados, as pessoas que iam e vinham. Não
havia nada que estivesse vivo que não fosse um milagre. A minha própria alma
fluiu para fora de mim numa grande alegria” [1].
[1] Cf. Margaret Prescott MONTAGUE, Twenty Minutes of Reality. An experience
with some illuminating letters concerning it, New York, E. P. Dutton &
Company, s. d., pp.7-11. Sobre esta experiência, cf. W. T. STACE, Mysticism and Philosophy, Londres, The
MacMillan Press, 1972, pp.83-84; Michel HULIN, La Mystique Sauvage. Aux
antipodes de l’esprit, Paris, PUF, 1993, p.37.
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