quarta-feira, 18 de junho de 2014

O novo ópio do povo: capitalismo, indústria do entretenimento, infantilização e narcisismo


“[…] a indústria do entretenimento – da televisão à música rock, do turismo à imprensa cor-de-rosa [não esqueçamos uma certa utilização das redes sociais, os jogos de video e o futebol] – desempenha um importante papel de pacificação social e de criação de consensos. Este facto está muito bem resumido no conceito de “tittytainment”. De que se trata? Em 1995, reuniu-se em São Francisco o primeiro “State of the World Forum”, no qual participaram cerca de quinhentas das pessoas mais poderosas do mundo (entre outros, Gorbachev, Bush júnior, Thatcher, Bill Gates…) para discutirem a seguinte questão: o que fazer no futuro com os oitenta por cento da população mundial que deixarão de ser necessários para a produção? Zbigniew Brzezinski, ex-conselheiro do presidente Jimmy Carter, teria então proposto como solução aquilo a que chamou “tittytainment”: às populações “supérfluas”, e potencialmente perigosas em virtude da sua frustração, seria destinada uma mistura de alimento e de entretenimento, de entertainment embrutecedor, para se obter um estado de letargia feliz semelhante à do recém-nascido que bebeu do seio (tits, em jargão americano) materno. Por outras palavras, o papel central assegurado tradicionalmente pela repressão – enquanto estratégia para evitar conflitos sociais – passa a ser em grande medida acompanhado pela infantilização (mas sem que esta substitua aquela por completo, ao contrário do que alguns parecem crer). […] Existe um isomorfismo profundo entre a indústria do entretenimento e a deriva do capitalismo para a infantilização e o narcisismo. A economia material mantém estreitos laços com as novas formas da “economia psíquica e libidinal””

- Anselm Jappe, Sobre a Balsa da Medusa. Ensaios sobre a decomposição do capitalismo, Lisboa, Antígona, 2012, pp.101-103.

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