domingo, 5 de janeiro de 2014

O Fado: paixão pura, gratuita, (...) "dom sagrado"


"E fica a Voz, uma voz dorida que sai das entranhas como a flama de um lume que a tudo consome. Paixão pura, gratuita, sem outro fim senão o de arder, tanto maior quanto mais se oferta: "dom sagrado".

Dos becos e vielas do coração obscuro de Lisboa ou dos salões da aristocracia castiça uma mesma Voz se ergue, quando o crepúsculo reabsorve na treva as femininas formas da cidade branca e rosa. O vento, que outrora engravidava as éguas no Monte Santo, vem agora dedilhar as cordas de uma guitarra portuguesa. O Tejo empresta a frescura e o ritmo das suas vagas. E as ninfas, sereias e tritões tomam forma humana, vestem-se de negro, à luz da Lua, para ficarem mais nus, mais íntimos à Noite absoluta. Então as Musas, as camonianas Musas, sopram: a celebração começa.”

- Paulo Borges, "O Fado", in Do Finistérreo Pensar, 2001.

Sem comentários:

Enviar um comentário